E me pego outra vez pensando no fim. No fim de tudo que diz
respeito a mim. Uma imensa vontade de desistir. Resetar. O caos está sempre a
espreita, escondido no dia-a-dia, na rotina massacrante destes dias fúteis.
Tento encontrar algum alento escrevendo este texto sem nexo pra enganar, pra
fugir. Ansiedade é isso, é querer acabar pra começar e acabar denovo. Um eterno
fim, onde o início é mero coadjuvante.
Sento mais uma vez na única mesa desse café – livraria –
lanchonete. Penso no absurdo que é este tipo de lugar que simplesmente é tudo e
nada ao mesmo tempo. Penso em você. Queria te ligar e dizer que tinha razão. Minha
vida é frágil e no fundo eu não passo de um ser imaturo e fraco. Um idiota
sensível. Um sujeito completamente despreparado para a vida. Eu queria
telefonar e te chamar para dar uma volta na paulista, mas já não sou seu amigo.
Nem sequer moro mais em São Paulo. Quem sabe você pudesse dizer que me avisou.
Falar na minha cara, gritar como costumava fazer. Eu queria te encontrar pra
mostrar que meu plano deu errado. O sonho foi retalhado e não há imaginação que
resista aos métodos destrutivos de uma vida adulto-moderna.
Me viro em direção ao balcão para pedir outro café e os
olhos dela acidentalmente encontram os meus. A velha sensação denovo. Os olhos
claros, a pele extremamente branca e os cabelos ruivos criam um contraste
curioso, completamente fora do nosso contexto latino americano dos trópicos. O
suor na testa e o crachá da “firma” pendurado no pescoço são a ponte que liga
ela ao mundo real. Seria difícil acreditar na humanidade desta mulher. Deus,
ela é linda.
Ela senta e pede um cinzeiro. Dá um longo trago no cigarro e
seu olhar agora assume um aspecto cansado. Como se estivesse de saco cheio de
esperar por uma reação minha. Nosso encontro acontece nesse lugar todas as
terças, que é o único dia que me sobra para sentar e ler alguma coisa na hora do
almoço. Nunca trocamos uma palavra. Um amor construído no silencio. Um silêncio
perturbador, que me faz pensar denovo no fim. Talvez ela seja a morte, que vai
me matar e acabar com essa maldita ansiedade e me fazer nascer denovo. Ela apaga o cigarro, se levanta e vai embora.
Eu nada faço. Apenas penso na próxima terça.
Hellfrick