Tuesday, November 20, 2007

Irreversível

Dei de cara com ela, nua, debruçada na janela da sala. Nunca tive cerimônias. Nem precisava bater para entrar no apartamento da Sarah.

A surpresa foi tão grande que não tive tempo de ficar sem jeito, nem pedir desculpas ou coisa assim. Muito menos ela se adiantou em se vestir ou ir pro quarto. Sarah entrou na sala e foi logo apresentando a nova moradora do Ap. Até os meus 30 e poucos nunca tinha sido apresentado a uma mulher que estivesse pelada. Nem homen diga se de passagem.

“Elle é um nome bonito, simples, como tudo devia ser”.

Apesar de toda a situação, eu nunca me senti tão conscientemente sóbrio. A visão daquela mulher, sei lá, deve ter liberado um neurotransmissor, tipo tranqüilizante que alterou toda a perspectiva da observação. O corpo sardento, das costas até o rosto, tinha algo de estranho. O nariz longo e o pescoço muito fino compunham uma aparência de um réptil deliciosamente sensual. Veio-me a imagem de uma iguana dançando jazz (odeio este tipo de pensamento).

“Você costuma andar pelada por ai?”. “Na verdade não. No banho eu ouvi um estrondo de acidente e corri pra ver. Eu não consigo me acostumar com o barulho de São Paulo”.

Claro que ela não é daqui. Nesta terra não brotam coisas assim. O tempo estava seco na capital e enquanto ela falava teve que molhar os lábios umas duas vezes com a língua. Se eu tivesse que editar o filme da minha existência, esta cena ganharia alguns bons segundos.

“A Sarah não me disse que tinha namorado. Você liga de eu ficar nua?” “Por mim tudo bem, e eu não namoro a Sarah, mas bem que podia (Não sei porque eu disse isso).

Ela respirou fundo, como quem quer finalizar o papo. Reparei nas costelas.

“Ok então, foi um prazer conhecê-lo.”

Obviamente que o prazer tinha sido todo meu. Elle passou por mim caminhando com a leveza de quem não foi contaminada pelo demônio paulistano frenético. Observei ela de costas, suas pernas, ligeiramente tortas e exageradamente maiores do que o tronco. Meus olhos convergiram para a bunda e percebi que não tinha mais volta. Na janela, vendo os carros eu tive a sensação de que toda a minha vida iria mudar depois daquele encontro. E mudou.

hellfrick

Monday, November 19, 2007

Maya

É imprescindível que nestes tempos de caos, estejamos conscientes da grande ilusão que é esta nossa realidade. "Será que é isto mesmo?" Viver como ovelhas comandadas por uma consciência coletiva, que rumina quase todo tempo de vida servindo ao sistema do consumo em prol da felicidade comprada.

hellfrick

Tuesday, November 13, 2007

Reencontro

Eu não estou doente pra você me visitar. "Não se sinta honrada. A visita não é por você. Odeio ouvir que você teve outra recaída por minha causa." Não seja tolo Hellfrick. Você caga e anda pra tudo até pra você mesmo. Veio me ver pra tentar se sentir vivo. Pra testar esta sua carcaça morta e buscar qualquer sentimento dentro dela. Não vou te dar este prazer, não desta vez. Você me salvou, ok. Mas e daí, me tirou do inferno e jogou num céu de mentiras. Como ecstasy fiquei viciada em dose de fantasias. Você é um anúncio e eu fui seu público alvo. Tudo direcionado, figurino, cenário, roteiro, tudo pra conquistar o cliente, tudo pra me ganhar. Quantas vezes eu, cúmplice do ator principal, vivi seus filmes, suas aventuras, fui personagem de sua história?

Você cansou não é? O livro acabou, o filme chegou no fim. Depois de uma semana que você foi embora, eu acordava de ressaca e me perguntava se você existiu de verdade. Tive que encontrar fotografias pra provar que seu rosto, seu cabelo, o all-star e até suas camisas horrorosas eram reais. Eu despertei de um sonho, porque é isso que você é, um sonho. E sonho não ama, não sente e nem fode. Eu abri os olhos e estou do mesmo jeito quando te conheci, lembra?

Mas agora que eu acordei consigo te enxergar. Eu tenho pena de você Hellfrick. Suas atitudes, suas idéia, os gestos, trejeitos, tudo falso. Tirado de algum lugar, imitado de alguém que nem você sabe quem é. Coitado de você seu merda, que nunca vai encontrar você mesmo. Nunca vai ter o prazer de te conhecer. Está condenado a viver a existência alheia pelo restos dos seu dias.

Naquela noite que você praticamente me achou deitada no palco do bar, eu estava assim não era? A ponto de acabar com tudo. Mas olhando você agora na minha frente eu fico realmente contente. Estranhamente feliz, por saber que eu posso sentir tristeza, com meu coração inflado como uma bomba preste a explodir, eu percebo toda dor que existe em mim. Mas isso tudo vai passar, e sabe por que seu filho da puta? Porque se hoje eu estou infeliz, amanhã eu conseguirei sentir com toda força a felicidade.

Monday, November 12, 2007

Bilhete

Você tocou meu coração e minha alma, seu pequeno filho da puta. Gostaria que você tocasse a minha campainha agora, para que pudesse beijá-lo novamente e desaparecer. Você me deixa louca meu doce, minha pele treme e aguarda ser abraçada por você.

Kate Moss

Tuesday, October 09, 2007

meditação, comprimidos e alongamento

Luzes apagadas, incensos, krishna das no cd player e dois dias inteiros sem dormir, sem ver tv, ler jornal ou falar com os malditos cabrões que agora estão ocupando o mesmo teto que eu. Depois que entrei nesta paranóia hindu percebi que pensar é chato, cansa e me deixa ansioso. Mente vazia e corpo limpo, isso que é bom.

Gandhi disse: "não há caminhos para paz, a paz é o caminho". Acabei escrevendo na porta do apartamento: "não tem estrada pra loucura, a loucura é o caminho." Carreguei dois galões de água pro quarto, quatro comprimidos e fiquei pelado em posição de lótus. Achei conveniente trancar a porta. Ommm........

No 2º comprimido eu sentia cada moléucula do meu corpo vibrando. Percebi que algumas células perto da virilha estavam em processo de divisão: 2,4,8,16, meu deus, se não parar por aí vai nascer outro pinto em mim. Puta que pariu, que sede! Hellfrick, seu corpo é o parque de diversão de si mesmo e o carrossel tá paradinho no mesmo lugar. 1 segundo é igual a que? Aliás. 1 milésimo de segundo equivale a quanto tempo? Você é quem sabe Hellfrick, sinta o "agora" e divirta-se com a felicidade. Uuuuhhhuuu.... eu amo todos vocês, mendigos, ladrões de mochila, diretores retardados, gerentes de merda. Amo você meu caro leitor. Ommmmmm....

A grande bola azul agora cobre o quarto todo. Um refletor dentro do meu peito dever ter registrado 1 milhão de watts. É possível que meu cabelo esteja em pé. Alías todos os meus pêlos estão em pé e meu pinto acusando 360 graus. Que sensação. Opa, a coisa ficou séria. A energia concentrou no pau, no saco, nas bolas. Sigo de olhos fechados, recuso me abri-los. Tá tudo queimando ali... “Poooorra Claudinha, tá fazendo o que aqui? Ta loca? Como é que entrou?” “Esqueceu que eu tenho a chave baby? Não lembra mais que tem namorada? Deve ter esquecido né, três dias sem dar notícias, sem atender o telefone, fiquei preocupada e vim até aqui.” “Você não leu o bilhete na porta do quarto? Te passei um e-mail ontem avisando que eu ia fazer yoga no fim de semana.” “Poxa vida Hellfrick, senti saudades, queria te ver, sei lá, transar, daí entro no seu quarto, você pelado, com o pau de um jeito, que desde a primeira vez que fudemos eu nunca tinha visto, quis te fazer uma surpresa, achei que tava gostando.” “Na verdade estava bom sim.” Mas a verdade mesmo era que meu corpo ficou faminto naquela garota falando sem parar. Um congresso de células tinha acabado de acontecer e a decisão foi: atacar. Aquela coisa toda, meditação, comprimidos, alongamento acabaram me dando uma puta vontade de fuder alguém. Nem preciso dizer pra onde o sangue voltou a se concentrar. “Desencana Claudinha. Engole uma balinha que ta aí no criado, enche um copo’dágua, chupa este Halls preto e apaga a luz.”

Saturday, June 30, 2007

toda sexta

E de repente é o fim da semana “útil” e a sexta-feira vai se esvaziando do clima de escritório se enchendo com os ares de fim-de-semana. Eu, como de costume, um pouco febril neste horário, caminho apressando entre carros, mendigos, pessoas, merdas de mendigo, desviando como se fossem obstáculos. Os pensamentos adquirem um peso e eu pareço estar carregando uma tonelada no pescoço. Mas hoje eu me sinto diferente, mais distraído e um pouco sonolento. O fluxo mental está a mil por hora. Sinto vontade de chorar e no minuto seguinte, estou a sorrir sinceramente para moça do caixa na padaria. Estou louco pra chegar em casa e deitar um pouco e quem sabe cochilar antes de comer.

Deito na cama de tênis mesmo. Estou no meio do caminho entre dormir e estar consciente. Poderia dizer que eu estou subconsciente? A TV e o transito estão mudos e sinto até um prazer nisso. Mas dura pouco, porque acabo de ser ejaculado no meio de um corredor, largo e longo e branco. Não me parecia ser um daqueles sonhos que a gente se vê de cima. Minha visão esta na “primeira pessoa”. Tenho a sensação de estar perdido, conheço bem este sentimento. Decido seguir em frente no corredor apesar de não visualizar seu fim. Estou muito confuso. O silencio incomoda. Alguém escreveu conselhos na parede e começo a ler todos. Vejo cabines de vidros com pessoas dentro. Elas estão querendo me dizer alguma coisa. Uns se esforçam para que eu entenda, mas eu não os ouço. Outros estão mais exaltados, não se conformam com o fato de eu não poder ouvi-los. Tem gente até chorando. São pessoas conhecidas, amigos, parentes, namorada. Começo a esmurrar uma das cabines de vidro, sem resultado. Nem mesmo o barulho dos socos é possível ouvir. Sinto uma tristeza muito grande e uma solidão enorme assume meu peito e sinto lágrimas emergindo parecendo vidros. Sigo lendo os conselhos escritos na parede. Acabo de ler um bem estranho: da próxima vez o corredor será mais longo.

Abro os olhos e sinto um vento frio da janela do meu quarto. Esta começando o Jornal Nacional e o barulho da rua está cada dia pior. Felizes são os que conseguem sonhar nesta cidade. Dou um sorriso e saio da cama.

Wednesday, April 25, 2007

Pretérito do Presente Imperfeito

O que fazer quando jogamos a caixinha fora? Aquele pequeno baú secreto. Cheio de fotos amarelas, cartas antigas, contas de bar, bilhetes de cinema, documentos inválidos, letras de música e mais um bocado de velharias. Fragmento do passado, pedaços da historia, enfim, chame do que quiser. Está tudo no lixo agora, ex-namoradas, ex-amigos, ex-colegas, ex-tudo. Não me dei o trabalho de por fogo. Pronto, estou novo-denovo.

Sinto-me leve - Acendo um cigarro - Um pouco vazio talvez. Não agüento e corro no lixo. Pego uma foto e a saudade finca uma agulha no meu peito e o sangue jorra dos meus olhos e as lágrimas borram a fotografia. O estranho é que o que mais sinto falta não é das pessoas ou dos objetos. Lembro do cheiro e do sabor com muito prazer, mas o que me traz alegria é a recordação do meu estado de espírito. Da energia vibrante, do tesão, da força e da confiança em mim, - uma vodka ia bem – em tudo.

Reviro o lixo. Esta tudo espalhado pelo chão. Resgatei um CD antigo e agora danço ao som orquestral da minha memória. Bebi demais. Acabo de cair em cima de uma carta. Como pude acreditar nisso? Fiquei com vontade de ligar e falar umas verdades. Quem você pensa que é? Outro cigarro. Junto tudo de novo.

Agora vai. Na privada não tem jeito. Descarga. Puta que pariu. Entupiu. Descarga denovo. O jeito é dançar mais um pouco no chão inundado do banheiro. Um brinde aos velhos tempos. Tim-Tim meu amigo. Como você foi ficar tão velho? Onde você arrumou esta mulher? Esqueci, você não bebe mais.Bebo eu. Tudo ensopado, fica mais fácil. Descarga denovo.

Uma foto. Uma única. Três, cinco, sete, nove descargas. Ela insiste em não ir pro esgoto junto com as outras. Justo esta porra? Tinha que ser. Tive medo de olhar para aquela antes. E girando na privada esta maldita foto tirada de uma polaroid, naquele maravilhoso dia de sol, às duas horas e trinta e seis minutos da tarde do ano de 1971, na cidade de Bom Sucesso do Sul, não deixa eu me livrar do pretérito do presente imperfeito.

Aumento o som. Pego a foto na privada. Danço a dois, dois pra lá e dois pra cá. Já sei seu perfume, não precisa me falar. Se você soubesse o quanto eu te amo. Se você soubesse sua vadia, não tinha feito o que fez. Piranha, puxou a mãe. A culpa foi minha, quem mandou eu me meter com você, sabia desde o começo. Que saudade meu amor. Mas eu não posso te perdoar. Não depois de tudo. Por fogo é mesmo a solução. Pego o álcool.

O que fazer quando jogamos a caixinha fora? Arrumamos outra vazia.

Vou sair. Comprar vodka e cigarros.

Monday, April 16, 2007

Ansiedade

Ansiedade
Coisa da idade
a mãe fala
vaidade
o pai pensa

Ansiedade
Ali
Aqui
De dia
Que noite?

Ansiedade
Coração na guela
A boca seca
e nesta cela
Acendo uma vela

Ansiedade
Inspiro
Expiro
Ontem, hoje ou amanha?
Quem sabe

Ansiedade
O futuro chega
O tempo passa
O passado me chama
E hoje já foi

Thursday, March 01, 2007

Carrancas


Tuesday, February 27, 2007

Alucinações - por Nelson

O seu portão anuncia, mas e agora, estará chegando ou indo-se daqui? Atormentado por pensamentos de incertezas finjo a satisfação.

O ronco de um veículo qualquer me desvia a atenção e saio a qualquer hora em desespero súbito. A rua está vazia. A esquina me atrai. A aflição me leva até ela, o medo só não é maior do que a dor de ver o que não se quer, mas é necessário. Eu e a lua olhando para a esquina, a agonia abranda e volto em companhia dos meus pensamentos.

E se esta dor doer mais forte, eu não tenho mais lágrimas mórbidas, reservei uma gota para que caia de felicidade, mas agora estou tão cansado.

O euself tá de volta com um texto do nosso sumido colaborador. Críticas, sugestões, berros, elogios deste texto é só comentar ou mande um texto para nelsaosf@ig.com.br

pop island